Champollion
Quem primeiro me
deu notícias de Champollion, ou melhor, Jean-François Champollion,
foi meu sempre lembrado professor Pedro Martins Sant’Ana, entusiasmado
lente de História do velho Colégio Diocesano, nos idos dos anos
cinqüenta. Era sensacional falarmos sobre a civilização egípcia
com suas pirâmides, seus vales, os túmulos de ouro, os grãos
de trigo de 3.500 anos, as jóias, as máscaras de ouro, toda uma
parafernália de objetos significativos da riqueza e da evolução
dos habitantes do vale do Nilo e paragens norte-africanas. Mas o que me fascinava
mesmo era a história de Champollion; o lingüista francês que
decifrou os hieróglifos e permitiu todo o conhecimento do passado do
Egito. Todo, ou quase todo....
Agora, a imprensa abre colunas para a comemoração dos cento e
cinqüenta anos da grande vitória do sábio francês face
aos mistérios do passado remoto, de quando a primeira grande cortina
foi afastada para deixar o curioso vislumbre de intenções egípcias,
nobres e faraônicas. Vitória de lá e vitória de cá;
de Champollion, por ser lembrado tanto tempo depois, numa espécie de
consagração; da imprensa, por saber valorizar os altos feitos
intelectuais, as iniciativas que engrandecem a espécie humana.
Quando a conhecida expedição de Bonaparte ao Egito, em 1799, o
capitão Bouchard, cavando umas fortificações nos arredores
do porto de Roseta, perto de Alexandria, encontrou uma placa de basalto gravada
no ano 196, Antes de Cristo, em honra ao soberano Ptolomeu. Essa placa tinha
3 inscrições distintas, as 2 primeiras em egípcio antigo,
a terceira em grego, tradução da primeira. O descobrimento de
diversas nacionalidades, embora todos fracassassem nos intentos de decifrar
a pedra da Roseta. Coube, então a Champollion, o apaixonado estudioso,
encontrar a chave da leitura, obtendo um texto claro e exato. Depois de algum
tempo, é claro, em 1818, para dar certo com a nossa comemoração
dos 150...
Em dois anos de obstinados esforços, Champollion conseguiu estabelecer
uma teoria completa e coerente dos signos hieróglifos, com indicações
semânticas e gramaticais. Cada palavra – descobriu ele – estava
composta de duas classes de signos: os que representavam uma idéia e
os que representavam um som. Em resumo, encontrou ele a chave dos sinais simbólicos
e dos sinais fonéticos. Mais alguns anos, a leitura do egípcio
lhe era familiar.
Em 1828, uma excursão que o levou a delta do Nilo aos confins da Núbia,
passou também por Karnak, Luxor, Abu Simbel, Tebas, Menfis e Gizeh, dando
os últimos retoques na sua sabedoria. Foi uma consagração!
Em 1966 passei horas e horas de emoção procurando encontrar a
Pedra de Roseta, no Museu de Louvre, em Paris. Era uma busca alegre e curiosa,
intensa e solitária, de quem viajava sozinho como turista. Nele encontrei
a Mona Lisa, a Vitória de Samotrácia, um mundão de coisas
lindas e de inestimável valor, mas não encontrei a Pedra de Roseta,
página-texto de Champollion.
Na terceira visita ao Louvre, já desistente, perguntei a um vigia da
seção egípcia e ele sorriu de minha ignorância de
assuntos da cultura francesa: a Pedra de Roseta não está em Paris;
infelizmente, encontra-se em poder do Museu de Berlim.
Espero vê-la algum dia...