Alegria na Natureza
Mais cedo
que de costume, Olímpia me acordou bem antes das seis, e me disse que
estava chovendo. Queria saber se eu havia apanhado a roupa lavada do arame,
como me pedira ontem à noite, depois que eu tinha chegado da Faculdade.
Marido exemplar, certas horas, respondi afirmativamente e me recordei de uma
alegre sensação de paz, do carinhoso cheirinho de roupa lavada,
tão grato à vida em família. Todos nós, mortais,
pensei, devíamos cantar diariamente um hino de louvor às lavadeiras,
criaturas que nos permitem o conforto da limpeza e do bem-estar. Ótimo,
acordar assim. Nada melhor do que a felicidade, principalmente de manhãzinha...
De pé, volto ao quintal, manhã já clara, embora a névoa
de chuva, cheiro de chuva, festa de primeiras chuvas. Tudo bem, só havia
esquecido, no arama, algumas toalhas, do lado mais escuro, onde o holofote nada
me mostrara durante a noite. Mais, só alguns jeans da garotada, que ainda
bem molhados, deixei lá de propósito.
A esta altura, tudo estava pingando água, translúcidas gotas de
início de estação, generosas, bonitas, merecedores de gratidão
nossa e da natureza. Um espetáculo, que se não tão interessante
para a dona de casa, para mim - sonhador - um encanto de poesia! Mais uma vez,
tudo bem com a vida...
Uma vez, não sei porque, no meio de uma conversa de escritório,
Pedro Narciso, falando de maravilhas da vida de fazenda, comentou sobre a quase
lubricidade com que o gado acorre aos primeiros brotos, às primeiras
flores de primavera. Uma pontinha de capim, por menor que seja, é uma
festa. Um galhinho, mesmo às alturas, é um motivo de esforços
instintivos, com pescoços esticados, línguas salivadas de desejo,
buscando um novo sabor de pasto verdejante, como que uma saudade criada e recriada
pelos meses de secura e magreza. São cenas gratificantes, o animal demonstra
alegria, o homem o vê assim, e, mesmo sem misticismo, agradece a Deus
a recompensa na recomposição do cenário em novo colorido,
verde escuro substituindo o amarelo-palha, amarelo cinza, cor viva substituindo
tons desbotados, o poeirento.
Em poucos minutos, de pé, olhando a chuva, remoendo experiências,
construo o quadro dessa crônica. Feliz, muito feliz, rendo graças
pela visão de transcendência, o poético, o artístico,
o real que o momento me ofereceu. Volto e dou um muito obrigado também
à minha mulher pelo presente do muito cedo me despertar... Afinal, existem
momentos melhores e mais gratos do que os da felicidade?