Uhracy
Faustino
De boca
aberta
Em nossas
brigas não voam televisões,
nem há corporais agressões:
o verbo é a flecha que nos perfura
mesmo nos tempos e modos que a gente se censura.
Trocamos o costumeiro texto sacana
por verborrágica luta insana
e, se alguém se sente em desvantagem,
apela pra figuras de linguagem,
misturando metáforas, pleonasmos,
com licenças poéticas, no orgasmo
ao medirem forças dois titãs.
Até que já sem fala, de manhã,
mais sedentos que famintos, como taças
nos bebemos um ao outro, extasiados
de repente sem palavras, embrigados,
(eis que a língua se enrola, a gramática falha),
nos lambemos em nossa cama de batalha,
onde desejos e tesões explodem atômicos
em delírios guturais, gozando afônicos.
Haikuras
O casulo feito
bicho dentro dele dorme
vestido de seda.
De papel crepom
eu, origamicamente,
desdobro mulheres.
Muitos ventos sopram.
Dentro e fora de mim uivam
lobos que não sou.
Se planto parreiras,
nestas videiras vermelhas,
eu colho ametistas.
Olavo
em extremos ou Bilac revisitado
(paródia de "In Extremis")
Sempre gozar assim! Sempre
gozar em noites
Assim! de lua assim!
Que despida pernoites,
Quente! prontos aos meus os teus lábios selados,
E molhando os teus os meus toques safados...
E uma noite assim! de lua assim! Sim, verão
Se fará sempre incêndio, sem meia-estação!
Chamas, brasas, faíscas, rubro fogaréu!
Gemidos nada brandos! O meu pau como troféu
Destrancando os portais, arrombando o casebre...
E em teu íntimo, o céu. E este afã! E esta
febre!
Nós dois... e, entre nós dois, amante e libertino,
A acercar-me de ti, sempre mais, o destino...
Eu com o membro febril a pulsar - vigoroso -
Por ti, tal o tesão desnorteio de gozo!
Tu, fitando mexer entumescidamente
O sexo que bailava ainda há pouco, recente,
O sexo que foi teu!
E eu dormindo! e eu dormindo
Sonho-te, e sonho a paz, e sonho a luz, sentindo
Tão voraz sem ligar ao cansaço que boda,
A carícia da foda! a carícia da foda
Frágil
Foi sem querer que quebrei
a xícara de porcelana inglesa,
aquela que eu te servia chá
nos momentos de paz,
ou veneno, em doses mínimas,
pra te matar a longo prazo.
Juntar os cacos, jamais.
Inteiro visto-me de gato,
olho já cerrado na caça,
atento a novos cios.
Consciência
Cansei de levar o mundo
nas costas,
de pisar em ovos
e segurar barras.
Agora quero uma cama de pregos,
uma colcha de arame farpado,
tachinhas nas luvas
e cravos nos chinelos.
Abrindo feridas,
posso cicatrizá-las.
O
dia do caçador
Não é o
colibri que passa apressado na minha
casa,
é o colibri que beija, sexualiza a flor batendo asa.
Não é a poesia que sai de uma noite insone
como que no desespero falasse seu nome.
Não é a vida que se leva rasgada de muitos amores,
é o amor regado de duas vidas ímpares e multicores.
Não é a palavra certa após o ato falho,
é o conjunto dos gestos que verbaliza o trabalho.
Não é a estrutura perfeita que faz o verso
é o subtexto que se descobre imerso
nas entrelinhas de uma obra aberta.
Não é a perseguição em lúcido
desvario,
não é a idéia brilhante em descoberta,
mas a escuridão deflorada
pelo desafio.
Eu sou a garca branca
que vive em bando
é sempre verde o meu olhar
sobre o povo os campos e o mar.
não rumino miséria
nem sentimento hostil
sobre estas terras descobertas num abril.
tenho - sem vergonha de dizer -
uma inexplicada paixão extremada,
por esta minha pátria amada.
minha terra tem olavo castro alvares e palmeiras,
tem helena maju kk cida sandra nilza banderas
minha terra tem cecília coralina alice e garças,
tem leminski behr gutfreind quintana graças.
minha terra tem leila e uma enorme riqueza
de sentimentos, letras, versos e beleza.
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