Lambada e outras danças
São Paulo,
(Planalto) – Espanto-me quando leio que alguns religiosos latino-americanos
estão querendo proibir a lambada, sugerindo condenação
aos que a dançam. Espanto-me com a preocupação que eles
demonstram ciosos de que o novo ritmo possa causar problemas morais às
pessoas, em vista da carga de erotismo visível na maior parte dos movimentos
e passos. Espanto-me que uma simples dança possa causar celeuma, quando
tantos desencontros do mundo moderno estão aí avassalando tudo,
ferindo, sangrando, machucando milhões de criaturas, que, inermes, nada
podem fazer quanto a uma possível defesa. Quantos outros tipos de diversão
também incentivaram paixões, acordaram instintos, permitiram apelos
ao sexo? Houve ocasião que o tango argentino quase entra na área
de proibições, e só não recebeu condenação
formal porque o Papa Pio X acabou gostando da coreografia e viu harmonia nos
movimentos dos dançarinos levados para uma apresentação
no Vaticano. O que poderia ser falado do Rock, do samba, da rumba, de tantas
danças até chamadas de alucinantes? Tudo chega, tudo passa, tudo
se renova, vai juventude e vem juventude, e o mundo está aí para
se divertir, para passar o tempo longe de outros pecados bem maiores. E a civilização
cristã não acabou por isso!
A introdução do assunto é para lembrar-me de momentos de
quase sonho, quando recordo da visão de pares dançantes, todos
eles inesquecíveis para meu gosto, e minha admiração a
quem realmente aprendeu a dar ritmo musical aos movimentos certos, com encadeamentos
de balanços bonitos e agradáveis. Vale a pena ver um casal que,
no entusiasmo de uma música, ou na paixão de um grande amor, esquece
o mundo e se entrega devagarzinho ao fluir suave dos sons, juntos duas almas
e dois corpos vivendo um para o outro, minutos eternos, marcando quase imperceptivelmente
os passos em perfeita harmonia. Haverá momentos mais deleitáveis
do que os de acompanhamento visual da dança de Anésia e Pedroso,
os melhores passistas desta terra? Em que tipo de música eles não
são os mestres da perfeição? São capazes de bailar
na ligeireza de uma ventania ou no mole e gostoso repassar de uma brisa de primavera.
Parece que nasceram juntos numa tarde tropical de todas as festas, semideuses
da arte que mais representa a vida e seus movimentos rítmicos.